No texto de Maria Angélica de Moura Miranda o registro de uma passagem do Zeppelin sobre o litoral norte paulista. Ao final, pesquisa feita por voluntários do NINJA e do ESCAU (Núcleo Infantojuvenil de Aviação e Espaço Cultural Aeronáutico de Ubatuba).
Boa leitura.
Bom domingo!
Do outro mundo
Maria Angélica de Moura Miranda*
Era mais uma madrugada de pescaria. João, com quase 12 anos, seguia junto com seu pai e mais dois conhecidos numa canoa grande [em São Sebastião, litoral de São Paulo].
Saíram do bairro de São Francisco, atravessaram o canal, fizeram o contorno da Ponta das Canas e aí sim, seguiram mar aberto em direção à Ilha de Búzios.
Quando o dia começou clarear, um ponto se destacou no céu e veio lentamente se aproximando. Diante do tamanho do objeto, o pai de João foi taxativo: recolheram a rede e seguiram para aportar em Búzios.
Chegando lá, juntaram-se a outros homens e ficaram observando, encantados, aquele objeto grandioso, que seguiu em silêncio rumo ao canal de São Sebastião.
Depois da pescaria voltaram para São Francisco e o comentário era geral, sobre o que passou voando no canal.
No dia seguinte: fim do mistério. Chegou a notícia de Santos. Aquilo era um Zeppelin, que, em visita ao Brasil, fez o trajeto Rio-Santos e acreditem: passou voando no canal de São Sebastião.
Ainda hoje, Seu João e outros caiçaras estão aí bem fortes, para contar esta história cheios de emoção.
*A autora: Maria Angélica de Moura Miranda é escritora e jornalista, em São Sebastião (SP).
Publicação: originalmente por O Guaruçá (www.ubaweb.com), em 27 de maio de 2010.
Os balões Zeppelin no Brasil
A passagem de um imenso dirigível rígido por São Sebastião, Ubatuba, Caraguatatuba e Santos, como o fato narrado na crônica “Do outro mundo“, de Maria Angélica de Moura Miranda, remete à época em que uma aeronave mais leve que o ar era o meio de transporte mais rápido entre a Europa e a América.
O fato da crônica pode ter ocorrido em uma das três oportunidades: 1936, pelo Hindenburg; 1933 pelo Graf Zeppelin; ou 1934, também pelo Graf.
Os dirigíveis, vindos de Friedrichshafen, na Alemanha, cruzavam o Oceano e chegavam em Recife, donde tomavam o rumo sul até o Rio de Janeiro, pousando inicialmente nos Afonsos e, depois, em Santa Cruz. Lá, até hoje (2024), existe o grande hangar dos balões, porém, agora, abrigando aviões da Base Aérea de Santa Cruz.
Foi o primeiro e único hangar construído no Hemisfério Sul, especialmente para os dirigíveis que traziam, desde a Europa, passageiros, correio e carga para a América do Sul.
1936 – Hindenburg
No ano de 1936, o dirigível Hindenburg, matriculado como D-LZ129, voou desde o Rio de Janeiro, até Santa Catarina, para visitar cidades do sul do Brasil colonizadas por alemães. Desta forma, o balão foi visto sobrevoando São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Brusque, Criciúma e Blumenau, entre outras localidades.
Nesta vez, entre as nove viagens do Hindenburg ao Brasil, no dia 30 de novembro de 1936, o então moderno transatlântico aéreo, navegando seguindo o litoral teria sido visto em São Sebastião (SP), ao fim da tarde. Este detalhe, quanto ao horário, pode significar que não foi nesta oportunidade o ocorrido descrito na crônica, já que menciona terem os pescadores visto a aeronave no clarear do dia.
Passou por Santos às 18 e por volta das 19 horas atingia a vertical da capital paulista. Depois rumou para Itanhaém, onde foi observado depois das 20 horas, e para Paranaguá (PR), notado aproximadamente às 21h45.
O Hindenburg media 245 metros de comprimento. Comparativamente, um Boeing 747 tem 70,7 metros. Poucos meses depois dessa viagem, no dia 6 de maio de 1937, o Hindenburg procedente da Alemanha, teve um incêndio, quando se preparava para pousar em Lakehurst, Nova Jersey, nos Estados Unidos.
O acidente destruiu o aparelho e, em consequência, esse tipo de transporte com balões cheios de hidrogênio foi descartado, desde então.
Foi construído pela empresa Luftschiffbau-Zeppelin GmbH, na Alemanha. Detém o título de maior aeronave a voar. Fez 63 voos durante seus 14 meses de operação.
1933 – Graf Zeppelin
Uma outra possibilidade para datar o relato da crônica foi em 1933.
Na manhã do dia 11 de maio daquele ano, o D-LZ127 Graf Zeppelin, construído antes do Hindenburg, afastou-se do ponto de atracação no Rio de Janeiro e se deslocou para a costa paulista, evitando área de condições meteorológicas adversas, enquanto aguardava a dissipação de nevoeiro no ponto de pouso no Rio.
Há registros que o dirigível sobrevoou as praias de Santos e São Vicente, a partir das 10h40. Às 11h35 rumou para São Paulo e 55 minutos depois estava de volta a Santos, aproando, finalmente, o Rio de Janeiro.
1934 – Graf Zeppelin Rio-Buenos Aires
Outra possibilidade de um dirigível ter sido visto no canal de São Sebastião, no episódio narrado na crônica de Maria Angélica, foi durante um deslocamento experimental, em junho de 1934, do Graf Zeppelin LZ127.
Fazia um voo de teste da rota Rio-Buenos Aires. No dia 29 de junho de 1934, já no Rio Grande do Sul, passou pelo Vale dos Sinos, impressionando as populações das cidades de São Leopoldo e Novo Hamburgo.
Depois sobrevoou a capital gaúcha, Porto Alegre, e seguiu para a Argentina, na única vez em que esteve em Buenos Aires.