As curiosidades do Direito Penal são tantas que às vezes trazem surpresas agradáveis, embora possam nutrir grandes e boas polemicas. Hoje quero falar de um tema que está em voga no dia a dia de milhões de brasileiros e estrangeiros que vivem no Brasil. Estou falando dos testes de “bafômetro”, com os quais convivemos desde a edição do novo sistema jurídico criado pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB).
Editado sob o clamor popular (este é um dos nossos maiores problemas), o CTB instituiu pesadas multas, pontuação negativa na CNH (Carteira Nacional de Habitação) e sua cassação, e até criou o “teste do bafômetro”, que passamos a temer e conviver. Como se transformou em um terror para os motoristas, a criatividade popular gerou estratégias curiosas que os etílicos utilizam para “disfarçar” a ingestão de álcool ou evitar sua comprovação. Uma delas é a recusa de fazer o “teste do bafômetro”.
A recusa era uma conduta inadmissível pela jurisprudência dos Tribunais. Porém, recentemente, a inteligência e a perspicácia de uma jovem advogada paulista, submeteu ao exame do Tribunal de Justiça de São Paulo, uma tese assaz interessante: a aplicação do princípio in dúbio pro reo no controle das sanções administrativas ou penais relacionadas ao tema. Estou falando da Dra. Larissa Fernanda Romão da Cunha, que adora as praias de Caraguatatuba. Ela sustentou perante o egrégio tribunal, que nestas situações conflitivas, há de prevalecer este novo entendimento do TJSP: a recusa em fazer o “teste do bafômetro” não gera a presunção do estado de embriagues do acusado. Atua, nesta situação, o “status” da dúvida.
Isto porque há um conflito entre a aplicação do § 3º, do art. 277 do CTB que impõe ao acusado o dever de fazer o teste, com a disposição do artigo 186 do CPP. Em resumo: quando o motorista é acusado de embriaguês pela autoridade fiscalizadora de trânsito e se recusa a fazer o teste do bafômetro, não mais será possível presumir que o motorista está embriagado. O acusador terá que fazer tal prova por outros meios legítimos e morais possíveis. Em princípio a ideia parecia absurda e até foi rejeitada pelo juiz de primeira instância que validou a multa aplicada ao suposto infrator.
Mas, a combativa advogada ingressou com apelação e ao examiná-la, o desembargador Ricardo Dipp, que foi sorteado como relator para o caso, prestigiou a tese, afirmando que não se trata de uma crise de constitucionalidade e sim de um confronto de normas subconstitucionais, devendo prevalecer à regra mais benigna ao acusado.
Quem gosta de “tomar uma” pode ficar relativamente mais tranquilo, porque o “teste do bafômetro” acaba de perder força, desde que o efeito da ingestão de álcool não apresente sinais exteriores suficientes para prova contra si memo. E, é claro, está de parabéns a nossa jovem advogada pela tese que defendeu, “conduzindo-se como uma verdadeira desbravadora do direito”.