Se eu soubesse que aquela seria a última noite que entraria numa locadora de vídeos, num sábado à noite, eu teria alugado os melhores clássicos do cinema e olhado com mais carinho para aquelas prateleiras repleta de fitas VHS (mais tarde DVDs e depois Blu-ray). Se eu soubesse que aquela seria minha última gravação em fita K7 no Polivox de duplo deck do meu pai, da minha música preferida, não teria xingado o locutor que falou no meio da música ou soltou a vinheta da rádio antes do final, e guardaria a fita num baú como se fosse um tesouro.
Se eu tivesse a mínima noção de que aquele domingo seria o dia do meu último pulo de Pogobol (o brinquedo ainda existe, meus joelhos não) teria pulado o mais alto possível e arriscado mais manobras radicais, como o giro 360°.
Ah, se eu imaginasse que o Playcenter um dia fecharia suas portas, teria me aventurado muito mais na motanha russa, ficado mais vezes de cabeça pra baixo no temido Kamikaze, assistiria mais vezes o Show dos Ursos e me encataria com mais frequência na montanha encantada. (Fico feliz por ter tido a oportunidade de juntamente com minha esposa, encantar nossa filha pouco antes do “fechamento das cortinas” do Playcenter).
Se eu sonhasse que naquela tarde de sábado, Eu e meu pai jogaríamos nossa última partida de tamborel no clube Matarazzo, teria proposto um jogo de “50 sets” e talvez deixado ele ganhar, só pra ver pela última vez o sorriso da vitória em seu rosto.
E aquele jogo de taco na pracinha da Rua Sérgio Ferreira no Bairro do Limão?
O futebol contra os meninos da rua de cima, (com bola de capotão e traves imaginarias feitas com chinelos ou tijolos), o vôlei com rede improvisada com corda de varal, as aventuras de “Polícia e Ladrão” nas bicicletas Caloi Cross e BMX Pantera com pedaços de frascos vazios de yakut presos na ferradura do freio, para gerar atrito no pneu e fazer barulho de moto (pelo menos na nossa imaginação). Ahhh, se eu soubesse que seriam as últimas vezes, as últimas brincadeiras…Com certeza chutaria a bola com mais vontade; capricharia mais na pontaria pra “derrubar a casinha” da dupla adversária; daria mais “jornadas nas estrelas” com a bola inevitavelmente caindo na casa do “Seu Dé”; e, pedalaria minha bike com mais velocidade para sentir aquele vento do finalzinho dos anos 80 tocando o meu rosto pela última vez.
Se eu soubesse que depois de ficar exausto de tanto brincar na rua, aquele seria meu último banho e café da tarde na casa dos meus avós, eu teria saboreado mais lentamente aquele salame hamburgues e o Quik de chocolate que minha avó comprava e fazia especialmente pra mim.
Se eu me desse conta de quantas coisas e situações seriam as últimas vezes, talvez eu fizesse diferente, ou talvez da mesmíssima forma. Nunca vou saber, pois como dizia um professor meu do colegial: “O “se” não existe.
O que sei, é que fazer aquilo que gostamos como se fosse a última vez, pode ser a melhor forma, ou quem sabe, a única forma de se fazer.
– Qual foi a última vez que você fez uma coisa pela primeira vez? Ou, qual foi a primeira vez que você fez algo pela última vez?
Carpe diem.