Por Belisa Maria Nunes.
A humanidade se comunica desde que o mundo é mundo. Comunica-se com o corpo, com a mente, com as palavras, com a vivência, com as coisas, com tudo o que se tem. Mas será que as pessoas dominam a arte de dialogar?
Segundo a socióloga e focolarina, Vera Araújo, “é necessário vencermos a velocidade do nosso dia a dia para encontrarmos momentos de reflexão, entendimento do sentido das nossas ações e dos nossos empreendimentos”. Para ela, fala-se sobre tudo: política, ideologias, cultura, economia, etc; tudo o que envolve e o que se acredita que compõe a identidade de uma pessoa, mas não se encontra momentos de pausa para analisar e aprofundar o sentido das ideias.
É preciso colocar a condição humana no centro da reflexão. Vera Araújo explica que, para deixar de ser “indivíduo” para “ser pessoa”, exige-se que, no ato do diálogo, se desgarre da armadura que defende as próprias ideias para dialogar com o outro, que também está cheio de certezas e verdades. Caso contrário, não nascerá um diálogo, mas sim um conflito.
Ser pessoa é reconhecer o outro como seu semelhante. Quando se relaciona, quebra-se a individualidade, que conduz para fora do “eu”. Assim, é possível descobrir o próprio “eu” no “outro”. A categoria indivíduo pode se transformar numa categoria pobre, abstrata e fechada. Mas, a realidade “pessoa” é rica de identidade, de valores, sobretudo de relações sociais, a partir das experiências comunitárias.
Quando uma pessoa se reconhece como um ser de dialógico, e dentro da perspectiva cristã também reconhece o amor de Deus, as formas de diálogo são diversas. Para Fábio Lacerda, cientista político, o diálogo pode despertar sensibilidades. “O ser humano é uma criatura relacional por natureza. Somos seres dialógicos. Estamos sempre em diálogo, seja com os outros, seja com Deus. A própria ausência de palavras, o silêncio, também é uma forma de expressão num diálogo com alguém. Acredito que o diálogo com Deus, o reconhecimento do amor que recebemos de Deus, nos serve de fundamento para o diálogo com os demais homens e mulheres”, disse.
Fernando Silva, Jardinista, relembra de uma experiência de conflito que viveu em casa com a esposa.
“Uma vez eu estava em uma conversa com minha esposa. Nós estávamos meio tensos. Percebi que ninguém estava dialogando de fato, porque eu não conseguia ouvi-la verdadeiramente. Decidi parar apenas pra ouvir e depois expor minha ideia. Assim, ela também se auto percebeu e a conversa fluiu. Acredito que, às vezes, o diálogo nasce também a partir da auto percepção. Não é fácil, mas é possível”, disse o jovem.
A Psicóloga clínica, Natália Dalmácio, explica que a relação é fundamental para a existência humana, portanto para estabelecer um vínculo seguro e forte, é necessária a empatia. Ela também ressalta que, Chiara Lubich, Fundadora do Movimento dos Focolares, propõe um modelo relacional de partilhar, que contribui para essa ciência.
“Chiara Lubich propõe um modelo relacional de comunhão, a reciprocidade comunional, que impulsiona à ‘total’ acolhida do outro, a pertença mútua, a disposição incondicionada ao dom gratuito de si. Neste sentido o diálogo seria facilitado pela escuta e acolhida do outro num encontro autêntico, profundo, mesmo se simples, sentem que cresceram, porque considera-se as diferenças e necessidades de cada parte, em uma dinâmica relacional pela gratuita reciprocidade”, enfatiza.
Uma pessoa é diálogo em si mesma, dialoga-se com tudo o que tem. O diálogo, segundo Vera Araújo, não é trocar ideia, não é uma discussão. O diálogo é um encontro entre pontes diferentes, entre interlocutores diferentes, que em profundidade se manifesta na conversa.
Para Lacerda, as pessoas tendem a construir uma barreira quando determinam a impossibilidade de dialogar com alguém que cometeu um erro, como se o outro não fosse passível de diálogo.
“Penso em argumentos do tipo ‘quem votou em X, é isso’, ‘não dá pra conversar com quem apoia tal pessoa’, etc. São justificações para o cessar do diálogo. No limite, a pessoa está dizendo que não se deve dialogar com pessoas que fizeram X ou Y. Talvez esses atos sejam realmente reprováveis. Mas, de novo, trazendo a frase de Jesus – ‘quem dentre vós estiver sem pecado, seja o primeiro a atirar uma pedra’ – talvez nos falte a humildade para lembrar que nós, também, fizemos muitos atos reprováveis. E que, com a mesma facilidade com que interditamos o diálogo com certas pessoas, elas também poderiam interditar o diálogo conosco, dado que fizemos X ou apoiamos Y”, disse o cientista.
A vida está sempre agitada, com interesses e responsabilidades. O mundo oferece diversas possibilidades de distração, é preciso encontrar pequenas pausas para perceber o outro e a si mesmo, para ir em profundidade no diálogo e estar aberto na construção de relações sólidas e fraternas.