Era uma terça-feira à noite, e a Central 190 da Polícia Militar recebe uma ligação no mínimo inusitada. Uma mulher, de 54 anos pedindo uma pizza. A princípio o policial que atendeu a mulher, acreditou tratar-se de mais um trote; fato que infelizmente é bastante corriqueiro. Para se ter ideia, só no ano de 2020, foram 500 mil trotes, ou seja, 20% de todas as ligações à Central 190.
No entanto, na “ocorrência da Pizza”, o desfecho foi outro. O Policial percebendo a insistência da mulher, bem como seu tom de voz, teve a sensibilidade para notar não tratar-se de um trote, mas sim de um pedido de socorro.
Assim, uma equipe da Polícia Militar dirigiu-se ao local da chamada e constatou que a mulher sofria constantes ameaças, violência física e psicológica por parte do marido agressor, e que a mesma simulou uma ligação para um disk pizza, como disfarce para um pedido de socorro à Policia Militar, sem que o marido percebesse.
Infelizmente, antes da viatura chegar ao local, o homem empreendeu fuga e até o momento não foi capturado. Porém, graças a perspicácia, preparo e empatia do policial que atendeu a ocorrência, a mulher foi salva da violência doméstica e quem sabe de mais um caso de feminicídio.
Casos de violência contra a mulher, como esse acorrido em Araçatuba, interior de SP, são cada vez mais frequentes, e segundo estudos de diversos órgãos de defesa da mulher, cresceram de forma exponencial durante a pandemia.
Dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, apontam um crescimento de 40% nas denúncias feitas pelo canal 180, que é a Central de Atendimento à Mulher.
Apesar do maior volume de denúncias, o aumento da violência doméstica escapa das estatísticas dos órgãos de segurança pública. A razão é que, isolada do convívio social, a vítima fica refém do agressor e impedida de fazer um boletim de ocorrência na delegacia. “A queda que houve nos boletins de ocorrência e processos no período de pandemia não corresponde à realidade das agressões”, conforme alerta a promotora Valéria Scarance, que coordena o Núcleo de Gênero do Ministério Público do Estado de São Paulo.
Estudos também apontam que a vulnerabilidade econômica social guardam intrínseca relação com o número de casos registrados. Em outro recorte da pesquisa, observa-se que mulheres negras e pobres, são as que mais sofrem com a violência doméstica.
Tais dados, reforçam a urgente necessidade de investimento pesado por parte do Poder Público em políticas sociais, educacionais e de segurança pública, que visem a proteção da condição da mulher e a quebra do “status quo” do machismo e violência que ganham cada vez mais protagonismo no Brasil. A vida de milhares de mulheres, diariamente são entregues à própria sorte, parte devido a ineficiência do Estado.
O desemprego, a falta de casas de apoio as vítimas de violência doméstica e de gênero, a desigualdade social, a falta de programas educacionais nas escolas, os maus exemplos de autoridades públicas que banalizam e até mesmo incentivam de forma implícita, explícita e estrutural o machismo, a “pseudo” superioridade masculina e a fragilidade das leis e penas brandas àqueles que cometem a violência, acabam passando uma mensagem de permissividade e impunidade ao agressor.
Por isso, faz-se necessário o engajamento e unicidade do Poder Público, entidades e Sociedade Civil para que os crimes e violência de gênero sejam tratados como um problema de saúde pública, que os agressores recebam punições severas e exemplares, e que as vítimas da violência sejam tratadas com respeito e dignidade em delegacias especializadas no atendimento às mulheres, para que assim não haja a “revitimizacão” das mesmas. De igual forma, é imprescindível e urgente a implementação de políticas públicas preventivas, que busquem a Educação de homens e mulheres sobre o tema, por meio de palestras, propagandas institucionais e programas governamentais de qualidade.
Por fim, lembre-se: Em briga de marido e mulher, se mete a colher SIM! Caso você saiba e/ou presencie um caso de violência contra a mulher: DENUNCIE.
Notas ao Leitor, Telefones Úteis:
190 – Polícia Militar
180 – Central de Atendimento à Mulher
100 – “Pronto Socorro” dos direitos humanos