Por Nelson de Oliveira
O novo coronavírus (Covid-19) tem causado diversas mudanças no mundo em que vivemos. O Brasil já é o sexto país em número de mortes causadas pela covid-19, segundo a Organização Mundial da Saúde. Infelizmente o número de vidas consumidas pelo vírus é de 155.460, de acordo com o Ministério da Saúde.
Medidas de prevenção foram tomadas pelo governo, como o isolamento social e suspensão dos serviços não essenciais em todo Brasil. Grandes empresas e fábricas se viram obrigadas a fechar as portas, a Bolsa de Valores chegou a despencar 39,28 % em menos de dois meses, atingindo recordes históricos. Sem dúvida, estamos vivendo a maior crise econômica mundial do último século.
Todos sofreram com as consequências da pandemia. O vírus não escolhe quem vai atingir, ele apenas o faz, desde o mais rico até o mais pobre, homens, mulheres, crianças, de direita ou esquerda, religiosos e ateus, todos estão vulneráveis a pandemia. Porém, a parte da população que mais sofre com a pandemia de coronavírus é a mais carente.
Donos de pequenos comércios e trabalhadores autônomos necessitam continuar trabalhando para sustentar as suas casas. Pode-se passar pela cabeça de algumas pessoas que em frente a um perigo tão grande a melhor opção seria ficar em casa e proteger-se do vírus, mas essas pessoas simplesmente não têm outra opção, precisam sair do conforto e segurança de seus lares, pois na maioria das vezes são a principal ou até mesmo a única fonte de renda em suas famílias.
Fabiana Aparecida das Neves é proprietária de Mercearia Beija Flor e tem sofrido bastante com as consequências da pandemia. Devido à quarentena, os números de clientes têm diminuído muito a cada dia “As pessoas sentem medo até mesmo de entrar em locais mais fechados, como aqui que é mais apertadinho, também tem a questão de muitas delas não terem se quer dinheiro para comprar como comumente compravam”, explica Fabiana.
Andando pelos corredores estreitos da pequena mercearia, percebe-se o cuidado da proprietária quanto à prevenção do novo coronavírus. Os funcionários utilizam máscaras. O álcool em gel está disponível na entrada do estabelecimento e placas sobre uso obrigatório de máscaras estão espalhadas nos corredores.
Pequenos comércios lutando para manter as portas abertas
Fabiana adquiriu a mercearia há pouco mais de um ano, segundo ela, quando estava alcançando uma média de clientes que “pagavam” o aluguel, as mercadorias e ainda geravam lucro a pandemia chegou e afastou os clientes. O comércio é a fonte de renda não apenas de Fabiana, mas também do marido, irmã e mais uma funcionária que trabalha com ela “Meu marido, além do serviço dele também me ajuda na mercearia atendendo os clientes e ficando no caixa. Minha irmã também começou a me ajudar, pois terei que fazer uma cirurgia e ela que ficará responsável pela mercearia nos dias em que eu não estiver presente. E ainda tenho uma funcionária que está comigo desde o começo. Ela me ajuda organizando as mercadorias, atendendo os clientes e é de suma importância a presença dela.”, explica.
Outro problema que assola a pandemia são clientes que abriram conta anteriormente na mercearia para pagarem no final do mês. Esses clientes sempre pagaram as contas em dia, por isso ela manteve esse estilo de vendas que facilitava a vida dos clientes e não à prejudicava em nada, porém esses clientes agora não possuem condições financeiras para pagar a conta “Muitas vezes eles chegam e falam — Fabiana esse mês foi difícil. A pandemia não me deixa trabalhar, posso pagar no próximo mês? — E eu não tenho como dizer não, esses clientes sempre pagaram certinho, muitos deles são pessoas simples e se eu não deixar pagar fiado aqui, eles não terão condições de manter suas casas”, destaca solidária à situação dos clientes.
Com isso, falta dinheiro para Fabiana continuar repondo as mercadorias da mercearia. “Os boletos vão se acumulando, chega no final do mês e fica difícil de manter a mercearia aberta, temos que quase escolher entre comprar um produto ou outro”, compartilha
Por sorte, o marido de Fabiana com seu outro emprego consegue ajudar com a renda, pagando as contas da mercearia. “Se não fosse o meu marido nós já estaríamos sem dinheiro para repor as mercadorias. Espero que as coisas se acertem logo, esse período difícil passe, pois se a pandemia se estender por muito tempo não sei se conseguirei manter o meu comércio aberto”, desabafa.
Tralhador autônomo
Leandro Silva trabalha como pedreiro autônomo juntamente ao seu pai. Para Leandro, infelizmente o futuro da área de construção civil autônoma se tornou uma completa incerteza. Disputar espaço de trabalho com grandes empreiteiras já era um desafio antes mesmo da pandemia, mas sempre encontravam alguns serviços pequenos, os chamados “bicos”. Fazia reformas, reparo de torneiras e encanamento, trocas de piso, assoalho, telhado, assentamento de janelas, entre outros trabalhos, até mesmo algumas construções maiores como as raras oportunidades de construir uma casa inteira.
Esses trabalhos já eram suficientes para Leandro e seu pai conseguirem ter uma renda praticamente fixa e pagar as contas, porém além da dificuldade de conseguir serviços grandes, a pandemia agravou ainda mais a falta de demanda de trabalhos “Um dos nossos clientes já havia fechado negócio para a construção de uma casa. Esse seria um dos nossos grandes serviços, que geraria renda fixa de seis meses a um ano. Porém, devido a quarentena, o cliente teve que cortar gastos e infelizmente desistiu do serviço, pois não teria condições de pagar todo o material e mão de obra”, lamenta.
Leandro também afirma que outros quatro clientes estavam cogitando iniciar serviços de construção, porém as negociações foram canceladas pelo mesmo motivo. Antes, a agenda de trabalho do pedreiro era lotada: “Facilmente nós tínhamos três obras fixas no mês, além de alguns bicos que apareciam no meio da semana.” Atualmente, eles trabalham em apenas uma obra, essa que tem previsão de término em apenas dois meses e, até agora, nenhuma outra oportunidade de serviço apareceu. “Nós literalmente estamos navegando em um mar de incertezas.”
O medo de ser contaminado pelo vírus também é mais um dos desafios enfrentados por Leandro e muitos outros autônomos. Segundo ele, a obra em que ele trabalha se localiza no bairro Porto Novo, em uma área conhecida pela pesca. “Eu não sei por qual motivo, as pessoas que moram próximo a obra andam muito pela rua, todos desprevenidos, sem o uso de máscaras e facilmente podemos encontrar algumas aglomerações nas margens dos rios aonde vão para pescar. Esse tipo de comportamento, no cenário atual, me apavora, não tem como eu saber quem está contaminado ou não.
Acordar cedo e sair de casa todo dia para trabalhar causa muito medo, mas é necessário para essas pessoas que só possuem uma fonte de renda, seus trabalhos, sem qualquer tipo de apoio “Com certeza se eu pudesse ficar em casa durante a quarentena, tomando cuidado, eu ficaria, mas essa não é uma realidade possível, eu preciso trabalhar”, declara.
O Auxílio Emergencial do Governo Federal
Algumas pessoas, como o próprio Leandro, precisam correr o risco de serem infectados e saírem para trabalhar afim sustentar seus lares. Mas o Auxílio Emergencial do Governo Federal não pode amparar essas pessoas?
Segundo o site oficial do auxilio do Governo (Clique aqui para entrar) “O Auxílio Emergencial é um benefício financeiro destinado aos trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados, e tem por objetivo fornecer proteção emergencial no período de enfrentamento à crise causada pela pandemia do Coronavírus – COVID 19”. O benefício oferece o valor de R$600,00 durante três meses e também pode ser concedido a até duas pessoas de uma mesma família.
Nosso entrevistado, Leandro Silva, afirma que solicitou o auxílio, porém sua família não foi aprovada, pois sua renda é superior a predeterminada para a aplicação do benefício.
Leandro e seu pai trabalham por meio de uma microempreendedores individuais (MEI) onde normalmente recebiam uma renda que era o suficiente para todas as despesas “Se a gente trabalhasse todo dia como era nosso cronograma em várias obras, realmente nós receberíamos bem, porém com a quarentena e a diminuição dos clientes, a renda caiu mais da metade nos últimos meses, impossibilitando de pagar algumas contas”, se queixa. Além disso, os serviços de construção civil também possuem várias despesas como ferramentas que precisam de reparo, combustível e manutenção do veículo para se deslocar até o local da obra.
Outro ponto levantado pelo autônomo, é que mesmo se conseguissem receber o auxílio não seria o suficiente para suprir as necessidades. “Tivemos que mudar ao máximo nosso padrão de vida diminuindo gastos. Por exemplo, no trabalho, em vez de comprar marmitas diariamente, passamos a levar comida de casa, mas é impossível mudar os padrões de vida de uma hora para outra! Móveis parcelados, aluguel da casa, financiamento do carro entre outros não são possíveis eliminar de uma vez”, afirma Leandro.
Fabiana Aparecida, dona da Mercearia Beija Flor, se quer recorreu ao auxílio, sabendo que não conseguiria ser beneficiada. “Eu trabalho em um comércio, como estou em funcionamento, não posso pedir o auxílio. E mesmo que pudesse, eles poderiam alegar que eu vendo comida e não preciso do auxílio. Iria ser uma grande dor de cabeça, correndo riscos de ser infectada naquela fila enorme que se acumula em frente a Caixa Federal.” Afirma Fabiana.